#1 Da baciada de notícias na África ao DESNORTEANDO na Indonésia
Histórias de viagens transformadoras na caixa de entrada do seu e-mail
Eu tinha 34 anos de idade na primeira vez em que desnorteei. Havia feito algumas viagens antes, sempre para destinos consagrados. Europa, Estados Unidos, países da América Latina… O Brasil eu conhecia quase inteiro por conta do trabalho como repórter. As coberturas de duas campanhas presidenciais – 1994 e 1998 – tinham me levado a 25 das 27 capitais, mais uns tantos interiores do sertão profundo e toda a fronteira amazônica, ao Norte.
Em 2005, quando desnorteei pela primeira vez, minha bússola estava em parafuso.
A carreira em que eu havia investido 16 anos era um sucesso, mas não me satisfazia. A vida emocional era uma montanha russa. Longas subidas arrastadas, entremeadas por vertiginosos mergulhos afetivos vividos em parcelas, uma noite de cada vez… O coração? Batia por alguém do outro lado do mundo. E assim eu desnorteei.
Jamais fui capaz de esquecer o espanto nos rostos da equipe que eu liderava no hoje finado Jornal da Tarde. Eu era o editor do Primeiro Caderno. Repórteres, editores de área, chefes de reportagem, ficaram desnorteados também. Como assim, indo embora? Para qual jornal? Qual revista?
Fazia sentido. Nas trocas anteriores de emprego, eu sempre havia saído de uma redação para outra, com cargo melhor, salário maior… Mas não daquela vez.
– Vou para a África.
África?!?!?!
Ninguém entendeu nada.
O então editor de Economia, Valmir Zambrano, me chamou de lado, mais tarde. Aquilo não podia ser verdade. Ele tinha certeza que meu destino era uma redação concorrente, mas eu não queria abrir o jogo.
Era mesmo verdade. Eu estava desnorteando. Embarquei poucas semanas depois para a África, numa viagem solitária, com uma mochila nas costas. Sem notebook. Apenas câmera fotográfica, caderno de capa dura e uma lapiseira. Sem data para voltar.
Ok, internamente eu imaginava um prazo. Passaria pelo menos três meses desnorteado. Poderia ficar mais, mas não menos. Seria uma derrota se eu voltasse antes.
Qual era mesmo o propósito da viagem? Ou seria melhor perguntar: qual é mesmo o sentido da vida?
Bom, aquele alguém do outro lado do mundo estava na Etiópia. Coincidência, claro. Não tinha nada a ver com ela. Não nos falávamos havia algum tempo. Além disso, eu comecei minha jornada pela Cidade do Cabo, na África do Sul. Tecnicamente não era mais o outro lado do mundo. Ainda assim era o outro lado de um continente que, vá lá, é quase um mundo.
O sentido racional que dei àquela desnorteada, era outro. Refazer, por terra, o caminho de Vasco da Gama na famosa viagem que transformou a história da humanidade. Aquela de 1497 às Índias em que, pela primeira vez, uma nau europeia superou o então Cabo das Tormentas, hoje Cabo da Boa Esperança.
Uma viagem transformadora da realidade. Abriu caminhos para que os europeus saíssem pelos mares colonizando outros povos e moldando o mundo como conhecemos hoje. Para o bem e para o mal.
A viagem completa de Vasco da Gama, ida e volta, levou mais de dois anos – contando os 5 meses em que ele ficou parado na Índia tentando estabelecer relações comerciais. A minha durou três meses e eu não cheguei à Índia. Parei na ilha de Lamu, no norte do Quênia.
Naquela primeira viagem desnorteada eu mandava notícias por e-mail para amigos e familiares. A cada nova cidade, eu sentava num computador de aluguel em algum internet café com dois objetivos.
Precisava de leitores de CD-ROM para descarregar as fotos em CDs. A câmera, uma das primeiras Nikons digitais, armazenava as imagens em cartões SanDisk de 32, 64, 128 megabytes.
Precisava de acesso à internet para enviar relatos do meu progresso até ali. No assunto do e-mail, o nome com que batizei os relatos: “Baciada de Notícias”. E o endereço do remetente começava com “ferdinaafrica”.
Era uma maneira de atualizar os amigos, tranquilizar a família. Um canal eficiente, simples e rápido. Não existiam newsletters naquela época, mas o princípio era o mesmo: só recebia os e-mails quem havia me passado o contato para receber notícias.
Desenterrei essas memórias de 20 anos para explicar por que estou criando agora esta newsletter.
Para quem está chegando aqui pela primeira vez, vale explicar. O DESNORTEANDO é um espaço para compartilhar experiências de viagens transformadoras. Aquelas que vão além das fotos que a gente nunca mais abre no smartphone, e além das selfies nas redes sociais. Ele nasceu em setembro de 2024, depois de eu me mudar para Bali, na Indonésia, com a família – eu, aquele alguém do outro lado do mundo e nossos dois filhos adolescentes.
O DESNORTEANDO já tem site na internet, canais no Instagram e no Youtube, página no Facebook… São tantas plataformas que por vezes me pego pensando: onde, afinal, as pessoas interessadas em ler vão encontrar as histórias que compartilhamos?
O melhor lugar do mundo virtual, provavelmente, é a caixa de entrada do e-mail de cada um. Exatamente como era há 20 anos.
Você não precisa pesquisar no Google, não precisa procurar na feed… Basta se cadastrar no botão abaixo. Cada vez que tivermos relatos novos – a princípio, serão semanais –, você os receberá na sua caixa de entrada.
Nesse início de jornada, vamos compartilhar histórias de Bali, Singapura, Camboja, Tailândia, Laos, Austrália.
Vou falar, sobretudo, das minhas transformações internas com tudo o que vivo e experimento nas viagens. Provavelmente farei flashbacks de histórias daquela primeira vez em que desnorteei pela África e de outras desnorteadas por Angola, Índia…
Memórias que se conectem com as experiências de hoje, que ajudaram a me transformar no que sou. Para o bem, e para o mal.
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Ah, e indique aos amigos e amigas interessados e interessadas em roteiros e histórias de viagens que fogem dos conceitos tradicionais de turismo.
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Desde já, a minha gratidão por ler e compartilhar as histórias do DESNORTEANDO.
Que delícia revisitar essa estória sob um novo ângulo!
..embarquei junto...